sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

REPORTAGEM: Do papel ao som das letras






daipasquim@hotmail.com, em 22 de fevereiro de 2013.

Se diante de uma folha em branco de papel tudo pode ser criado, diante da página de um livro ou caderno preenchido com caligrafias e fontes variadas pode haver uma confusão danada. Alguns distúrbios de aprendizagem, como a dislexia, reflete em pessoas inteligentíssimas, com amplo domínio verbal, que na hora da leitura podem trocar letras, como “p e b”, “f e v”, entre outras. Para casos assim está indicado um novo método, o Panlexia, estudado em agosto de 2012 pela terapeuta ocupacional em Pato Branco, Norma Dall’Igna, especialista em neuropediatria e neuropsicologia. O curso com duração de uma semana teve a presença de neurologistas, neuropediatras, psicopedagogos, pedagogos e outros profissionais. O método já vem sendo aplicado nas escolas da rede municipal de Curitiba para a reeducação dessas crianças.

Dislexia é o distúrbio em que a criança, apesar de ter acesso à escolarização regular, falha em adquirir as habilidades de leitura, escrita e soletração que seriam esperadas de acordo com seu desempenho intelectual. Mas como o desempenho intelectual não pode ser rebaixado, trabalha-se na associação do som, que é a ferramenta de trabalho da terapeuta ocupacional no método Panlexia: consciência fonológica.
Dados de 2002 da teórica Capovilla, que estuda inclusive o cenário brasileiro, indicam que a dislexia atinge de forma severa cerca de 10% das crianças em idade escolar e de forma leve, em torno de 25%.

Como funciona
Trabalha-se com um caderno de exercícios para dificuldades específicas de linguagem, evoluindo em volumes. Inclusive, o método fônico tem se mostrado muito mais adequado em crianças de ensino regular sem distúrbios na escrita. O trabalho é feito a partir do reconhecimento da discriminação do som. São sessões de 40 minutos, de duas a três vezes por semana, para tratar os distúrbios de linguagem. Quanto à duração do tratamento, vai depender do quanto à criança vai se empenhar.
“Na educação tradicional temos o nome da letra, o P e o B. A consciência fonológica é o som da letra. Não é “p” com “a” que dá pá. É o /p/ (pã) com “a” que dará “pa”. Fica muito mais fácil para a criança se alfabetizar”, ilustra a terapeuta.
O Panlexia traz avaliações quanto à idade da maturação fonológica da criança. “Já peguei várias crianças com quatro ou cinco anos de idade fonológica e quando aplicamos o nível um e dois, ela consegue se igualar a sete ou oito anos de idade fonológica. O salto é muito grande e temos como fazer essas avaliações, mensurando o quanto ela consegue progredir em um ano. É um período em que ela consegue crescer de dois a três anos obtendo êxito, através da consciência fonológica. A gente faz com que a criança reconheça o som das letras e note, por si só, o erro dela. Jamais vou falar o erro dela. Ela mesma vai perceber, porque ela passa a ter noção do som”, explanou. Quando a criança cresce em idade fonológica o resultado só pode ser melhora na escola.

Discriminação
O perfil do aluno disléxico (leia destaque) normalmente acarreta algumas outras complicações sociais. “Noto a autoestima em baixa, ele não tem muitos amigos, são crianças inseguras, isoladas, que preferem não brincar e ficam muito mais tempo no computador com joguinhos, do que jogar futebol ou ir à educação física. São inseguras e mais tímidas. Às vezes, em decorrência, a criança chega a ter sinais de hiperatividade”.
Por essas e outras, Norma sempre envia às escolas um relatório com estratégias para a sala de aula em assistência ao aluno disléxico.
Nesse sentido, a pedagoga Franciele Lorenzi, atuando há cinco anos numa escola particular em Francisco Beltrão, acredita que “a escola tem papel fundamental na identificação dos primeiros sinais de transtornos da aprendizagem. Nas reuniões pedagógicas e Conselhos de Classe, orientamos os professores que qualquer observação que considerar importante em sala de aula deverá ser repassada para a Orientação da escola”.

Pais transpondo dificuldades

A pedagoga Franciele menciona ainda que a reação dos pais são as mais diversas. “Tem pais que se escondem atrás do "problema" do filho, outros que nos trazem laudo médico preocupadíssimos com a condição do filho e como a escola pode auxiliar no tratamento e temos também os que não aceitam a situação. Para muitos pais (apesar de que as dificuldades de aprendizagem sempre existiram) o assunto é novo e causa receio: meu filho com problema. E então, voltamos ao ponto dos cuidados com o que é dificuldade (pela metodologia, por algum problema emocional) e o que é um transtorno (dislexia, discalculia...) e como podemos ajudar o aluno. De extrema importância a família, a escola e um profissional habilitado estar fazendo o acompanhamento do aluno”, defendeu.
Quando os casos chegam à terapeuta, muitas vezes acaba se percebendo que a conduta equivocada pode estar nos próprios pais. “Um problema grande são os adultos, que muitas vezes acreditam que o aluno não se empenha, que é preguiçoso, mas às vezes é o contrário. Ele se esforça muito e obtém pouco resultado e como os adultos continuam dizendo, ele acaba que não se esforça mais, pois acredita que não vale a pena”, problematizou Norma Dall’Igna.


Idade para reeducação
Não há idade limite para aprender o método, mesmo adolescentes ou adultos. Norma menciona que pode ocorrer a reeducação e o desenvolvimento da consciência fonológica.
“A criança disléxica tem problema da consciência fonológica específica, onde tem muito mais dificuldade em aprender com o método tradicional. Já recebi inúmeros casos onde a criança e o adolescente chegam frustrados e sem vontade de ir para a escola, sem motivação para continuar. São vítimas dessa insistência de pais, mães, professores”.
Muitas vezes esse erro no trato com o disléxico é cometido sem saber que existem métodos próprios para tratar isso. “A pessoa continua lidando nesse jeito, às vezes nem é um erro que queremos cometer. Mas se for diagnosticado e em parceria com o neurologista, dentro da avaliação descritiva e minuciosa para dar o diagnostico e conduzir o tratamento, o método da consciência fonológica vai ajudar muito a pessoa disléxica”.
E o método pode ser usado com crianças em geral que não conseguem se alfabetizar, como as que possuem deficiência mental leve, Síndrome de Down e paralisia cerebral.

O papel da escola
A pedagoga Franciele Lorenzi afirma que “quando identificado um aluno com sinais de possíveis transtornos de aprendizagem a orientação é para dar maior atenção a esse aluno, em seguida entramos em contato com a família. No período contrário da aula regular, trabalhamos com o Projeto Tarefa na Escola, utilizando metodologias diferenciadas para que possam auxiliar nas dificuldades, ressaltando as habilidades do aluno, seja na oralidade ou na área que apresentar”, explicou, acrescentando que “o número de alunos reduzido nas salas de aula do ensino fundamental nos permite um acompanhamento individualizado atendendo as necessidades de cada aluno levando em consideração que todo ser humano difere em sua capacidade para dominar diferentes âmbitos: alguns possuem mais facilidade em matemática, outros em língua portuguesa, enfim. O ideal é que a escola permita à família entender que o problema do aluno é conhecido e que será feito de tudo para ajudá-lo, que se de uma atenção especial ao aluno encorajando-o a pedir ajuda e destacar sempre os pontos positivos para "superar" as limitações”, finalizou Franciele.

“Os adultos muitas vezes acreditam que o aluno não se empenha, mas às vezes é o contrário. Ele se esforça muito e obtém pouco resultado”, problematizou Norma Dall’Igna


Características do aluno disléxico

Na leitura
- lê pior que os colegas
- não lê por vontade própria
- comete muitos erros na leitura e palavras
- frequentemente se perde na leitura
- omite ou substitui as palavras
- não compreende aquilo eu lê
- lê lentamente com muitas dificuldades
- muitas vezes não lê a primeira letra de uma palavra u frase.

Na ortografia
- inverte as letras de todas as maneiras
- não escreve ponto e acentos
- não percebe a ausência e uma letra em palavra que escreveu
- parece não ouvir os sons como eles são, exemplo “rado” por “rato”.
- não sabe se é uma palavra ou se são duas (A mamãe)

Na escrita
- esquece como escreve uma letra
- muda a altura da letra
- deixa espaço entre as letras e uma palavra
- pega o lápis pesado e com pouco controle
- cansa quando esquece e reclama que a mão dói.
- tem dificuldade em se organizar no espaço da página
- mistura caixa alta com cursiva.

Comportamento
- diz que odeia ler e escrever
- não se interessa por leitura e escrita
- é preguiçoso
- demonstra interesse e faz observações inteligentes desde que não precise ler e escrever
- os adultos muitas vezes acreditam que ele não se empenha.

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